quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Comunicação

A comunicação em grupos e organizações

José Manuel Moran

Participamos de várias situações e formas de comunicação em grupos e organizações, mais ou menos significativas, presenciais e virtuais. Em cada uma das organizações, como, por exemplo, as ligadas ao trabalho, à educação ou ao entretenimento, desempenhamos papéis mais “profissionais” – em que mostramos competência e conhecimento em áreas específicas – e outros mais pessoais. Um médico, conversando num bar de um clube de tênis, continuará sendo visto pelas demais pessoas como um profissional da saúde. As suas opiniões sobre uma determinada doença pesarão mais do que as de um colega engenheiro sentado ao seu lado.


Essa competência maior ou menor e a forma como a exercemos – com mais ou menos simpatia – facilita ou dificulta a nossa comunicação no campo organizacional. Podemos ser vistos como pessoas competentes, mas de difícil convivência, ou muito simpáticos, mas pouco inteligentes.
Nos vários ambientes que freqüentamos, comunicamo-nos como pessoas realizadas ou insatisfeitas, abertas ou fechadas, confiantes ou desconfiadas, competentes ou incompetentes, egoístas ou generosas, éticas ou aéticas. Além disso nos expressamos como homens ou mulheres, jovens ou adultos, ricos ou pobres. Todas essas variáveis interferem nos vários níveis de comunicação pessoal, grupal e organizacional.


Além dos grupos físicos ou presenciais, adquirem hoje extrema importância os grupos virtuais. No ciberespaço, há uma ampliação virtual de todas as pulsações, inquietações, preocupações e soluções existentes individuais, grupais e sociais, em todos os campos, mas também uma potencialização de tudo o que procuramos de forma fácil e rápida. A internet é um espaço fantástico para novos negócios; quem deseja bisbilhotar ou aparecer encontra no ambiente virtual um campo fértil de possibilidades de fazê-lo. Políticos artistas, jornalistas, fanáticos, pedófilos, terroristas... todos encontram no ciberespaço formas de incrementar seus desejos, buscas, negócios, interações, propaganda.


Todos se encontram na rede, mas em grupos diferentes, em tribos diferentes. Cada um descobre suas referências, em que se sente confortável e acolhido. Os “diferentes” também se sentem acolhidos em grupos que não nos dizem nada ou que desprezamos, mas estão vivos, agindo e se expandindo também ao nosso lado. As comunidades virtuais com as listas de discussão são espaços ricos de aprendizagem, de troca e de marketing. Uns só têm alcance familiar ou local; outros se destacam mais e adquirem maior relevância, peso. Existem as estrelas do virtual, dos blogs: os mais acessados, os mais citados.


A sociedade aprende a difundir os princípios democráticos, mas também os preconceitos. Grupos xenófobos, racistas, fundamentalistas também usa a rede para promoção e divulgação de suas idéias. Há um desenvolvimento da inteligência coletiva, mas em muitas direções, mesmo que haja alguns valores e modos de vida mais difundidos, constatamos a força dos grupos pequenos, de religiões e ideologias obscurantistas.
Há formas novas de ação, de mobilização. É interessante observar como grupos marcam encontros para ações chamativas, momentâneas ou para os chamados flashmobs, em que, convocados pelo celular e pela internet, se reúnem para atos políticos momentâneos, mobilizando milhares de pessoas rapidamente em prol de causas específicas.

Comunicação nas organizações

O paradigma da cultura ocidental é de que a essência das pessoas é perigosa. Assim, elas precisam ser ensinadas, guiadas e controladas por aquelas que são investidas de uma autoridade superior.(Carl Rogers, Um jeito de ser, p. 65)

Esse modelo desconfiado, negativo e pessimista só nos traz problemas. Atualmente estamos percebendo a necessidade de investir em novos modelos de gerenciamento e de exercício do poder. Carl Rogers reafirma o significado de trabalhar em grupo numa perspectiva mais aberta, confiante:

"Talvez o significado mais marcante de nosso trabalho e de maior alcance futuro seja simplesmente nosso modo de ser e agir enquanto equipe. Criar um ambiente onde o poder é compartilhado, onde os indivíduos são fortalecidos, onde os grupos são vistos como dignos de confiança e competentes para enfrentar os problemas – tudo isto é inaudito na vida comum. Nossas escolas, nosso governo, nossos negócios estão permeados da visão de que nem o indivíduo nem o grupo são dignos de confiança. Deve existir poder sobre eles, poder para controlar. O sistema hierárquico é inerente a toda a nossa cultura".(Carl Rogers, Um jeito de ser, p. 65-66)

As pessoas são o ingrediente essencial das organizações . Se as pessoas, no seu conjunto, não mudam, as instituições não mudarão. As pessoas com liderança são as que ditam o ritmo das mudanças. Existem líderes que inspiram confiança e incentivam a participação; outros só impõem diretrizes e conseguem obter adesões superficiais. Em organizações autoritárias, há muito pouca comunicação real. Existem muitas mensagens unidirecionais e feedback pouco confiável. Muitos se limitam a obedecer e oferecer informações desejadas, esperadas, não as reais.

Por ter tido educação deficiente, principalmente no aspecto emocional, encontramos muitas pessoas mal resolvidas, que guardam rancor e esperam o momento de prejudicar alguém ou sabotar decisões tomadas. Elas conseguem atrasar significativamente o processo de mudança organizacional. Muitas delas estão mais atentas às críticas do que à cooperação, à sabotagem do que à colaboração. Funcionários mal resolvidos semeiam discórdia, divisão, mal-estar e pessimismo. Fomentam o ambiente de fofoca, de intrigas. Estabelecem redes paralelas de informação, que corroem a confiança, geram incerteza e envenenam umas pessoas contra as outras.

Existem grupos de pessoas que não sabotam diretamente, mas adotam uma postura passiva e indiferente quanto às mudanças. São aquelas que resistem silenciosamente. Aparentemente colaboram, mas, sem um controle externo, pouco produzem. Infelizmente nossa educação valoriza mais a obediência do que a autonomia; a competição do que a colaboração, e isso se reproduz no ambiente profissional.

Quanto mais evoluem as pessoas, mais evoluem as organizações. Pessoas mais abertas, confiantes e bem resolvidas podem compreender melhor e implantar novas formas de relacionamento, de trabalho, de cooperação. Estão atentas para o novo, conseguem ouvir os outros e expressar-se de forma clara, sem ficar ressentidas porque suas idéias não foram eventualmente aceitas. Cooperam em projetos que foram decididos democraticamente, mesmo que não coincidam com todos os seus pontos de vista.

Todos vivenciamos momentos especiais, em que conseguimos expressar-nos profundamente, compreender melhor o sentido das coisas e compartilhar sentimentos, afetos e ternura. Essas situações mostram que, mesmo esporadicamente, podemos mexer com o nosso eu profundo e encontrar nossa integração.
Esses momentos apontam para processos mais permanentes de realização e integração pessoal e grupal, que são possíveis se alcançarmos um determinado nível de equilíbrio, maturidade e liberdade. É possível ser mais livre, viver em paz, trabalhar produtivamente em grupo e constituir uma família. Esses períodos ocasionais de realização e plenitude poderiam ser mais constantes. É só uma questão de evolução pessoal e grupal.

Ficamos com a sensação de que nos tornamos mais plenos e realizados quando conseguimos “tocar-nos” emocionalmente, quando fazemos algo bom, quando participamos de algum tipo de encontro em que conseguimos quebrar nossos medos e barreiras. Quanto mais entrarmos em contato conosco, com o nosso eixo, com o nosso eu de forma autêntica, verdadeira, mais fácil será perceber, sentir, comunicar-nos e viver. Isso nos ajudará a mudar, evoluir, aprender e ensinar melhor, levando-nos a trabalhar de forma mais criativa e produtiva.
Em razão da resistência à mudança e das carências mal resolvidas, as pessoas procuram soluções parciais, porém não têm atitudes de honestidade profunda e de amor pleno por si mesmas e pelo próximo. Por isso, formam-se pequenos grupos que se fecham em si mesmos, competem com os outros e tentam ultrapassar-se de qualquer jeito, tornando-se desconfiados e críticos, com visões negativas e superficiais nas relações. E assim, burocratiza-se tudo. Criam-se estruturas rígidas de poder e de controle, com mil instâncias intermediárias de gerenciamento, de decisão, e a desconfiança mútua aumenta no mesmo nível que a infelicidade e insatisfação.

É possível mudar esse quadro? É, aos poucos. Muitos, quando estimulados, mostram-se prontos para novas experiências, para formas de gerenciamento mais flexíveis, para processos de comunicação mais participativos. Boa parte resiste à mudança, não acredita nela e a dificulta. É importante aprender a conviver com os resistentes. Vale a pena aproximar-se dos que querem mudar, dos que desejam experimentar formas menos centralizadoras, mais abertas.

As mudanças não se fazem por decreto, mas sim pela percepção do seu valor. E hoje há uma consciência bastante difundida de que o caminho é pela competência, pela interação, pela cooperação. É todo um processo de aprendizagem, de evolução e de mudança, cheio de marchas e contramarchas, de acertos e dificuldades. Mas vale a pena tentá-lo.

http://www.eca.usp.br/prof/moran/reorg.htm

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